BLOG/SITE DE CRÍTICAS TEATRAIS E DE DANÇA E FACHETTI PRODUÇÕES
APRESENTA:
ENTREVISTA NECESSÁRIA
INÉDITA!!!
Francis FACHETTI
O ARTISTA POR TRÁS DA FUSÃO DO
TEATRO E FLAMENCO.
O Blog/Site iniciou a temporada de Retrospectivas e INÉDITAS das inúmeras homenagens feitas aos artistas das artes cênicas em geral – teatro, dança, cinema, técnicos:
Operários das Artes – Documento Cultural.
TRAJETÓRIA DOS OPERÁRIOS DAS ARTES.
INÉDITA!!!
O Ator:
MARCOS FRANÇA
Francis Fachetti – Muito relevante que nos clareie essa sua efetiva integração na necessária Instituição CAL – Casa De Artes de Laranjeiras. O público desse Documento Cultural quer saber um pouco desse lugar e do seu educador trabalho – num pais que escraviza os artistas.
Marcos França – Ser professor é uma missão, acredito.
Estar com os jovens atores e ter a chance de passar pra eles um pouco da minha experiência é mágico. No entanto, acredito ser uma troca. Eu aprendo muito com eles também. Me trazem novas referências, um novo olhar pra questões onde o meu estava cristalizado.
A CAL é um espaço de acolhimento, diverso, plural. Tenho alunos do Brasil inteiro e de outros países. Gente que vem do Amapá ou da Europa pra fazer teatro no Brasil. E eu sempre digo que não posso ensinar o caminho da fama, porém posso mostrar pra eles que o Teatro é uma arte coletiva que se faz com o coração, com afeto e disciplina.
É um jogo que se joga junto.
Francis Fachetti – Apresente para todos – na ótica que achar melhor – quem é Marcos França: Cineasta; Produtor Cultural, Ator; Dramaturgo…
O espaço é seu!
Marcos França – Eu digo que sou um ator essencialmente. Todo o resto, as outras funções que o teatro e o cinema me deram, são desdobramentos desse desejo de estar em cena.
O ator é o arauto do seu tempo. Ele precisa estar diante da plateia como que à serviço dela. E ele que vai provocar, fazer pensar, afetar seus pares. É de uma responsabilidade imensa!
Francis Fachetti – Preste esclarecimentos sobre os seguintes Grupos Teatrais que trilhou veredas:
GRUPO DOIS PONTOS: Falando pelos menos de um espetáculo efetivado;
Marcos França – Tive a sorte de começar a fazer teatro com um grupo incrível de Niterói, dirigido pelo meu amigo Leonardo Simões.
Nesse grupo, fiz amigos pra toda a vida.
Artistas incríveis que admiro e acompanho como Marcos Ácher, Carmen Frenzel.
Esse primeiro contato com as Artes Cênicas foi fundamental para a minha carreira. Lá aprendi a dinâmica de um grupo teatral, o fazer coletivo. Aprendi a fazer teatro em qualquer lugar: numa quadra, numa escola, num salão.
Fizemos belos espetáculos como “O Mistério de Feiurinha” e o “Bicho de 7 cabeças”, todos adaptados de livros do Pedro Bandeira.
Uma linda adaptação de “Ou Isto ou Aquilo”, de Cecília Meireles. Tenho muito orgulho de ter feito teatro para crianças. Uma plateia sempre muito sincera e que responde imediatamente ao jogo cênico.
Francis Fachetti – GRUPO CARIOCA TEATRO DO PEQUENO GESTO: Falando dos espetáculos “A Serpente”; “Navalha Na carne”; “Henrique IV”; “AntigonaCreonte” e “Casa Da Morte” todos com direção de Antonio Guedes.
Marcos França – O Pequeno Gesto foi e continua sendo, o lugar onde me encontrei como ator.
Capitaneado por Antonio Guedes e Fátima Saadi, artistas e pensadores de Teatro. Um grupo que discute a linguagem no palco e a concretude da cena através de um jogo entre realidade e ficção; defende que os clássicos são eternos porque discutem ainda hoje as demandas de nosso tempo.
“A Serpente”, último texto de Nelson Rodrigues, foi um espetáculo incrível, de enorme sucesso, feito em 1997. Uma peça que acontecia de um fôlego só, com os atores em cena quase como numa coreografia, marcas definidas, desenhadas. Fomos indicados pra prêmios e a peça projetou o nome do grupo para todo o país.
Viajamos por todo o Brasil e Portugal levando as palavras do Anjo Pornográfico.
A Serpente – Direção: Antonio Guedes.
“Henrique IV”, encenada no ano 2000, foi especial para mim,
pois foi meu primeiro protagonista. Um mergulho na obra e nas questões de Pirandello, sobre realidade x ficção.
A peça estreou no Festival de Curitiba, e teve mais duas temporadas no Rio de Janeiro. Embora não tenha feito tanto sucesso como A Serpente, foi fundamental para minha carreira. Tão importante, que precisei revisitá-la 20 anos depois num monólogo.
Henrique IV – direção antonio guedes
“Navalha na Carne” foi uma experiência hiper-realista da obra de Plínio Marcos.
Acontecia num quarto da Casa Rosa, antigo prostíbulo dos anos 50 e 60, em Laranjeiras.
Achamos um quarto original, com azulejos e chão carregados de toda uma história. E a ação acontecia ali, com cerca de apenas 20 pessoas dentro desse quarto, onde só cabia uma cama de solteiro e uma mesa de cabeceira.
A plateia, muito próxima, compartilhava daquele recorte de vida de Neusa Sueli, Vado e Veludo.
Uma peça física, onde o embate era real, deixando a plateia por vezes constrangida de tão cúmplice daquele acontecimento.
Navalha Na Carne – direção antonio guedes
“AntígonaCreonte” e “Casa da Morte” são texto que discutem a política e o quanto o poder pode ser cruel.
O primeiro texto, adaptado de Antígona, de Sófocles, foi condensado para três atores em cena, Creonte, Antígona e Corifeu.
Embora, eu tenha entrado no espetáculo numa segunda fase, substituindo o ator Gustavo Ottoni, foi a peça que me fez retornar ao Pequeno Gesto, após um tempo de afastamento.
Antígona Creonte – Direção Antonio Guedes
“Casa da Morte”, de Fermín Cabal (2014), que tem como título original Tejas Verdes, traz sete relatos com base em fatos reais da época da ditadura chilena (1973-1990). São sete personagens que contam versões de um mesmo acontecimento: o desaparecimento de uma jovem militante.
O espectador precisa juntar os relatos e formar sua própria versão sobre os fatos. Aqui, o Pequeno Gesto optou por encenar um texto político, por ocasião do cinquentenário do golpe militar no Brasil e dialogando com o período turbulento das eleições de 2014, que desencadeiam no golpe contra Dilma Rousseff, em 2016. Acredito que o teatro tem esse dever, de levar para a cena as questões que estão em debate em nossa sociedade.
Gosto de dizer que sou um ator de grupo essencialmente. Acredito realmente que a intimidade e o afeto envolvidos em um coletivo são a verdadeira potência de criação.
Casa da Morte – Direção Antonio Guedes
Francis Fachetti – Nos relate um pouco da sua experiência na direção dos curtas-metragens e cite pelo menos um falando sobre.
Marcos França – No início dos anos 2000 fui fazer cinema.
Sentia falta de voltar aos estudos de uma maneira mais direcionada.
Como sou um ator que gosta de contar histórias, me vi voltado para roteiro e direção. O cinema foi e continua sendo uma grande paixão, mas o teatro não me dá muito espaço pra realizar essa arte, que demanda um tempo mais dilatado para sua execução.
No entanto tive grandes experiências com a sétima arte. Dirigi o curta “A Hora do Galo” adaptado de um conto homônimo de Claudia Lage com as gigantes atrizes Ivonne Hofman e Aracy Cardoso.
O conto conta a história de Lourdes e Ligia, irmãs na casa dos oitenta. Numa manhã, ao cantar do galo, Lourdes diz pra irmã que aquele é o seu último dia e pede pra mesma convidar amigos e parentes para a sua despedida.
Esse curta ganhou vários prêmios como: Melhor atriz no Cine PE 2005; Menção Honrosa do Júri Oficial no CURTA-SE (2005); Melhor ficção no FAM 2005; Melhor atriz no FAM (Festival Audivisual Mercosul – Florianópolis, 2005).
Francis Fachetti – Na Teledramaturgia nos apresente e fale sobre os seguintes belos e necessários trabalhos, e disseque algo sobre eles:
INCIDENTE EM ANTARES– 1994 – DIR. PAULO JOSÉ;
OS MAIAS– 2001 – DIR. LUIZ FERNANDO CARVALHO;
JK 2006 – DIR. DENNIS CARVALHO;
AVENIDA BRASIL. Dir. Amora Mautner;
ÊTA MUNDO BOM! 2016 – Direção Jorge Fernando.
Marcos França – Fiz menos TV do que gostaria, confesso. Porém guardo com carinho experiências que me foram marcantes.
Refiro-me principalmente às minisséries que tive a sorte de fazer, contracenando com grandes atores. Incidente em Antares, minha primeira incursão na TV tinha no elenco Fernanda Montenegro, que fazia parte do meu núcleo, Marília Pera, Paulo Goulart, Cláudio Corrêa e Castro… e ainda fui dirigido pelo grande Paulo José. Um homem que me acolheu ainda muito jovem para fazer parte daquela trama – uma adaptação primorosa da obra de Érico Veríssimo.
Ali tudo era novidade, a grandiosidade da TV e poder ouvir histórias nos camarins desses gigantes.
Já em 2001, quando fiz Os Maias, tive a sorte de contracenar com Walmor Chagas e como ficávamos muito tempo nos camarins, esperando para gravar, ficava ouvindo suas histórias e posso dizer que tive com ele algumas das aulas mais incríveis de atuação e história do Teatro Brasileiro. JK foi incrível. Tive a honra de representar Gustavo Capanema.
Nas novelas fiz dezenas de participações, porém gravar Av. Brasil foi especial pois caí numa obra já em processo, com os atores num ritmo intenso de gravação, o que me fez ter de entender muito rapidamente a proposta da direção de Amora Mautner que nos fazia “atropelar” as falas uns dos outros, como na vida.
Um naturalismo que não estava acostumado a experimentar.
Já em Êta Mundo Bom!, gostei de fazer um médico corrupto, Dr. Haroldo, e tentei trazer um certo ar farsesco para o personagem. Descobri que a TV é um mundo, onde o fazer artístico pode acontecer, mesmo com a velocidade e o modelo quase industrial de algumas produções.
Francis Fachetti – Desfilaram por esse Documento Cultural Operários Das Artes Decisivos/Limítrofes do Cenário Cultural com suas presenças no Emblemático CENTRO DE DEMOLIÇÃO DO ESPETÁCULO, contando curiosidades históricas desse templo, desse chancelar teatral irrefutável – assim como você esteve lá. Uma honra para esse Blog/Site desfiar os feitos com esse gigante ADERBAL FREIRE FILHO. Então, seja mais um desses operários e conte minúcias desse lugar referência mundial. O espaço é todo seu!!!
Claro, fale sobre: “O Tiro que Mudou a História” e “Tiradentes, a Inconfidência no Rio”.
Marcos França – Aderbal foi meu grande meste. Eu era um jovem ator quando fui fazer uma oficina com o Marcos Vogel, que era seu assistente na época. O que eu não sabia, é que Aderbal iria aproveitar alguns dos atores desta oficina para que fizessem parte de seu grupo o CENTRO DE DEMOLIÇÃO E CONSTRUÇÃO DO ESPETÁCULO.
Tive a sorte de fazer dois espetáculos que hoje considero históricos. “O Tiro que mudou a história” e estar ao lado de Claudio Marzo, Domingos Oliveira, Paulo José, Othon Bastos; assim como “Tiradentes – a inconfidência no Rio”.
O Tiro que mudou a história (1991) de Carlos Eduardo Novaes e Aderbal Freire-Filho, narrava o último dia de vida do presidente Getúlio Vargas no Palácio do Catete, em um espetáculo itinerante onde o público percorria as instalações do atual Museu da República, desde os jardins até o quarto onde Getúlio comete o suicídio.
Tiradentes – a inconfidência no Rio (1992), dos mesmos autores, percorria cinco espaços do Rio de Janeiro, com os espectadores cruzando a cidade em ônibus fretados. O Centro se definia como “um laboratório de teatro Contemporâneo” tendo como principal linha de trabalho “desenvolver a relação entre temas e estruturas dramáticas brasileiras e o sentido, o espaço e as formas do teatro hoje”. (Programa de O Tiro que Mudou a História, 1991).
Durante os quatro anos que ocupou o Teatro Glaucio Gill, o CDCE recebeu cerca de 30 grupos nacionais e estrangeiros, que além de apresentarem seus espetáculos, realizaram palestras, oficinas e exposições. O programa de intercâmbio possibilitou diálogos com grupos como Galpão (Belo Horizonte), Piolin (Paraíba), Bando Olodum (Salvador) Odin Teatret (Dinamarca), Galpón (Uruguai), Royal Shakespeare (Inglaterra), entre outros. Foi a troca com tantos nomes do teatro contemporâneo, que fez do Teatro Glaucio Gill, em Copacabana, um ponto de encontro para o teatro carioca naquele começo de década.
O Centro de Demolição e Construção do Espetáculo foi, portanto, durante sua existência até sua dissolução em 1996, um lugar de discussão sobre a cena contemporânea carioca e, de certa forma, incentivador do pensamento de diversas companhias que pleiteavam um trabalho contínuo.
E, no Núcleo de Teatro a Céu Aberto com os trabalhos: “Othelo, O Negro de Vereza” e “Os Dois cavalheiros De Verona”, direção marcos Vogel.
O Núcleo de Teatro a Céu Aberto era como se fosse um braço do Centro de Demolição.
Construímos um lindo teatro Elisabetano, todo feito de madeira naval, nos jardins da UniRio (que infelizmente não existe mais), com projeto cenográfico de Lidia Kosovski. E ali, literalmente a céu aberto, sujeitos a todas as intempéries do clima, investigamos algumas obras do Bardo: “Othelo”; “Os dois cavalheiros de Verona”, “As alegres mulheres de Windsor”.
Era incrível fazer Shakespeare e de certa forma tentar reproduzir o seu fazer teatral num teatro que remetia ao Globe Theater, local onde o dramaturgo experimentava suas criações.
Francis Fachetti – Torne Conhecido a “TRILOGIA POÉTICA” , se possível com pormenores sobre as pesquisas do projeto com cerne nas obras de Carlos Drummomd De Andrade; Mário Quintana e Manuel Bandeira.
Cite esses espetáculos.
Marcos França – A poesia sempre teve um lugar cativo na minha vida.
Neto de poeta, fui habituado a ler poesia desde criança. E entendo que isso formou parte da minha personalidade e minha paixão pela literatura e seu transpor para o palco.
No ano 2000 fiz “Drummond – um homem por trás dos óculos”, que acontecia num pequeno apartamento em Ipanema, o Barteliê. Nele, eu abria a porta para os espectadores (apenas 15 por sessão) e era como se o próprio Carlos em casa, os recebesse para um bate papo sobre sua vida e obra.
A direção de Antonio Guedes me deixava à vontade para experimentar dizer a obra de Carlos do jeito mais natural possível e próxima do espectador, como se fosse uma confissão. Este espetáculo posso dizer que é meu trabalho de maior sucesso, visto que 24 anos depois, ainda continuo a fazê-lo em eventuais convites.
Com o aval da família e em especial de seu neto, Pedro Drummond, tive a sorte de levar a peça para escolas, bibliotecas, e mostrar que o poeta que tinha o coração maior que o mundo, era de fácil acesso, e que falava de coisas do nosso coitidiano.
“Drummond: Um Homem por trás dos Òculos”
Direção: Antonio Guedes.
14 anos depois, fiz o projeto “Trilogia Poética” que incluía, além dessa peça sobre Drummond, um espetáculo sobre Mario Quintana e outro sobre Manuel Bandeira.
O interessante no projeto é que eram três espetáculos, com direção de três diretores diferentes, porém executados num mesmo cenário.
A cada semana, eu subia ao palco com um dos espetáculos, o que me levou a ensaiar as três peças de uma só vez. Uma experiência bem louca!
Se em Drummond, o poeta abria a sua casa para receber a plateia, em “Quintana – o aprendiz de feiticeiro”, com direção de Joana Lebreiro, o poeta gaúcho conversava com uma personagem recorrente em sua obra, a menina Lili.
“O Aprendiz De Feiticeiro”
Direção: Joana Lebreiro
Já em “Caminho para a Pasárgada”, direção de Ana Paula Abreu, era um pequeno musical, com canções que foram feitas sobre os poemas de Manuel Bandeira.
Bandeira em sua intimidade, de pijama, cantando entre seus livros.
“Caminho Para Pasárgada”
Francis Fachetti – Exponha algo sobre “Estranho Fruto” – documentário cênico que dirigiu, e o espetáculo com texto de Renata Mizrahi: “ E Se Mudássemos o Mundo?”.
Marcos França – “Estranho Fruto” foi um experimento que fiz após a pós graduação que fiz na CAL.
Recolhi algumas matérias e histórias reais sobre preconceito racial e escrevi a partir daqueles fatos uma dramaturgia. Chamei três amigos pretos para contar essa história. Foi lindo e forte.
Sem nenhum cenário, apenas três atores em cena contando histórias reais, cenas que eles próprios por vezes tinham vivido. Era um pequeno espetáculo, com pouco menos de meia hora, e que teria um desdobramento, porém apesar de termos ganho um edital que viabilizaria a sua continuidade, nunca recebemos a verba prometida. No entanto fizemos um circuito pelo Festival Home Theater e ganhamos melhor texto no Festival de Cenas Curtas de Niterói.
“E se mudássemos de assunto?” foi um espetáculo feito a partir de cenas curtas da autora Renata Mizrahi.
Foi uma demanda de meus ex alunos da CAL, o que me deixou muito orgulhoso.
É incrível quando seus alunos, após passar por toda a faculdade, chamam um professor para os dirigir.
A peça teve três temporadas lindas e lançou na vida profissional atores e atrizes que estão aí, trabalhando e criando.
“E Se Mudássemos de Assunto”
Francis Fachetti – Terminando com Chave de Diamante – Descortine essa necessária parceria com Hugo Sukman; sua paixão pelos Musicais Brasileiros – onde escreve e dirigi.
Se debruce em alguns musicais que nos deu a oportunidade de presenciar, e que esse Blog/Site já assistiu e resenhou crítica a respeito de alguns deles:
DEIXE A DOR POR MINHA CONTA – UM MUSICAL SOBRE A OBRA DE SIDNEY MILLER;
“Deixe a Dor por Minha conta”
Direção: Marcos França
COM AMOR, VINICIUS: Atuação de França e direção de Ana Paula Abreu; e NARA – A MENINA DISSE COISAS, musical com França e Aline Carrocino e direção de Priscila Vidca.
Marcos França – Antes de falar sobre a minha parceria com Hugo Sukman, gostaria de lembrar meu caminho pelo universo dos musicais brasileiros.
Em 2004, eu e a diretora Joana Lebreiro, criamos o Núcleo Informal de Teatro. Nosso primeiro espetáculo foi “Antonio Maria – a noite é uma criança!” – texto meu sobre a vida e obra do autor de Ninguém me Ama.
“Antonio Maria – a noite é uma criança”
Com Claudia Ventura
A peça foi um sucesso, com excelentes críticas e foi indicada pelo Jornal O Globo como uma das dez melhores peças cariocas do ano de 2004.
Dois anos depois, em 2006, escrevi e atuei em “Ai, que saudades do Lago!”, sobre a obra de Mário Lago e sempre em cena com Alexandre Dantas e Claudia Ventura.
“Ai Que Saudades do Lago”.
“Ai Que Saudades do Lago”
A peça também teve indicações para o prêmio Contigo e ótimas críticas. Já em 2008 o grupo fez seu último trabalho, “Aquarelas do Ary”, mais um texto meu, agora sobre Ary Barroso, também indicado ao prêmio Contigo de melhor musical brasileiro.
Esses espetáculos fizeram muito sucesso e percorreram grande parte do país através do projeto Palco Giratório do SESC. Tive a chance de com eles, atravessar o Brasil, do Acre até Porto Alegre, fazer espetáculos em cidades que sequer tinham um teatro. Uma experiência inesquecível.
Foi com essas viagens pelo Brasil que aos poucos fui tomando consciência do meu lugar como artista.
Domingos Oliveira disse uma vez para mim que todo teatro é político e que todo teatro também é um ato de amor. E foi somente viajando com esses musicais pelo Brasil que entendi o que ele queria dizer.
Que essa era a minha missão como artista: fazer política. Aos poucos fui tomando consciência do meu propósito. Fazer política. Ser político. Não uma política partidária. Não falo de partidos ou governantes, mas da política pela ideia de ajuntamento, de reunião. Pois levar o teatro para lugares em que somente a telenovela chegava, era de fato, um ato político. Ato que provocava uma reunião, uma assembleia, um coletivo em torno de um único propósito. Gente que se reunia pra ver não somente uma peça de teatro, mas pra se alimentar de um fazer artístico e trocar com a gente.
Com o fim do grupo, fiquei um bom tempo sem investir nos musicais, o que só aconteceu em 2011 com o meu texto “Na Rotina dos Bares”, um musical sobre a história da boemia carioca, dirigido por Ana Paula Abreu.
“Na Rotina dos Bares”
A peça, protagonizada pelo saudoso ator Antonio Pedro, contava a vida de Chico, um boêmio anônimo que ao conviver com grandes nomes da música brasileira, acabou mudando a vida dessas pessoas. Chico falava de suas aventuras com Noel Rosa, Vinicius, Tom Jobim, Carmen Miranda, Aracy de Almeida, Antonio Maria, Zé Keti e Nara Leão. Uma espécie de Forrest Gump, Chico estava lá nos momentos que marcaram a história da MPB. Um espetáculo que tenho muita saudade e que gostaria de montar mais uma vez.
Hugo Sukman e eu somos grandes amigos e dividimos a mesma paixão pela música brasileira. Ele, um grande jornalista especializado em MPB, me parecia o parceiro ideal para contar novas histórias.
Um dia marcamos um chopp e eu provoquei: Podiamos reunir forças, que tal? Você com seu conhecimento musical e eu com minha experiência de teatro. Ele topou na hora.
Nosso primeiro projeto foi “Deixa a dor por minha conta”, que escrevi e dirigi, sobre a obra de Sidney Miller.
Nos reuníamos à tardinha em sua casa e costumamos dizer que Sidney estava lá ao nosso lado só nos ajudando a juntar os pedacinhos de uma história que ele já tinha escrito.
Descobrimos que todo o universo das suas canções já indicava uma peça. O botequim, o violeiro, o circo, o carnaval, a morte… temas que, recorrentes em suas músicas, nos levaram a criar a história do Violeiro em busca de Maria numa quarta-feira de cinzas.
O texto falava da aventura de ser artista, do julgamento que há por se fazer essa escolha, o que muitas vezes não é bem compreendido por parte da sociedade. Infelizmente a peça teve apenas uma temporada, pois não conseguimos verba para manter um elenco tão grandioso.
Já “Nara, a menina disse coisas” foi um convite de Aline Carrocino através da Priscila Vidca, que tinha trabalhado como diretora de movimento no “Deixa a Dor”.
Eu e Hugo escrevemos o texto debruçados nas entrevistas de Nara Leão e em seus depoimentos. Durante o processo, achei o relato que Nara fez de alguns de seus sonhos e isso foi colocado na peça. Estávamos em 2018, ano de eleição e queríamos que o espetáculo trouxesse o discurso politizado da cantora. Foi incrível, falar de uma mulher que peitou a ditadura, que quase foi presa, e que experimentou diversos estilos musicais, da bossa nova ao samba.
Já em “Com Amor, Vinicius”, direção de Ana Paula Abreu, também de 2018, optamos por mostrar um lado B de Vinicius de Moraes.
“Com Amor Vinícius”.
“Com Amor Vinícius”
“Com Amor Vinícius”
O espetáculo simulava um show do poeta, quando ele, após ser expulso do Itamaraty pelos militares, teve a chance de se apresentar como sempre quis.
O poeta, com uísque na mão, um violão, um livro e seu olhar sobre o Brasil. Mais uma vez, eu e Hugo optamos por levar ao palco um Vinicius politizado. E selecionamos da obra do poeta um olhar humanista, contra as ditaduras, de um amor pelo seu país e com uma evidente preocupação contra o fascismo que se apresentava. Falávamos de um Vinicius em 1964 para dialogar com o Brasil de 2018, véspera das eleições e sobre o perigo que corríamos.
Portanto, todos esses musicais brasileiros, que escrevi, sozinho e depois com o Hugo Sukman, revelam o artista que habita em mim. Costumo dizer que sou a soma de todos os meus personagens.
Eles deixam marcas perenes em mim e moldam a forma de como eu vejo o mundo. Não sei subir ao palco sem me identificar com o que tenho a dizer. Por vezes, minhas escolhas são mais difíceis, pois não abro mão disso. Há que se ter muita responsabilidade para defender um texto e fazer-se ouvir por uma plateia. O artista é o arauto de seu tempo. Ele para ele que param para ver e escutar. Portanto, é muito importante saber o que queremos dizer.
É isso que hoje tento passar para meus alunos: que essa profissão é uma missão e que estamos à serviço de algo. Algo que é maior do que nós. Algo que diz respeito a todos. É por isso que sonhamos. Somos feitos da mesma matéria de nossos sonhos, dizia Shakespeare. E cabe ao artista, sonhar esse sonho junto com seus pares.
Francis FACHETTI – Reporto aqui a lembrança por fotos de um lindo e necessário espetáculo que tive a oportunidade de presenciar e me deliciar com a sensibilidade e talento do ator Marcos França com direção de Antonio Guedes.
Simplesmente:
MARCOS FRANÇA